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Crónica: A Voz do Cigano – A Nossa Justiça

30/12/2020

Porque nunca se chamam as autoridades quando há um problema com os membros da mesma comunidade de etnia cigana?

A etnia cigana tem a sua própria lei, que só é válida e aplicada quando ambas as partes «réu e queixoso» sejam de etnia cigana e enquanto for acompanhada pela razão e homens de razões! Esta lei, que atravessou gerações, foi criada pelos nossos ancestrais e transpassada oralmente de pais para filhos e familiares e assim sucessivamente. Então seria um desrespeito aos nossos sábios anciões, por não confiarmos na sua justiça e por esse motivo nunca chamamos as autoridades, a não ser por motivos de causa maior que fujam das mãos aos anciões.

Cada família tem a obrigação de usar e educar os seus filhos dentro da nossa lei.
Chamamos de razão à nossa lei porque lei só há uma e esta é uma lei constitucional de Portugal. Quando os casos são de força maior então recorremos a quem tem a última palavra que são os tribunais. Mas sempre que se possa resolver dentro da comunidade, não levamos um «irmão» à justiça.

Quem são os homens de razões? Os homens de razões são aqueles que ganharam o respeito pela comunidade. Principalmente são homens sábios de idade avançada, não muito dados ao álcool, que não se machucam na boca nem nos seus feitos, já que mentira é um crime muito grave entre a comunidade cigana, é expressamente proibido um cigano mentir a outro cigano . São homens de muita autoridade e muito respeito por parte de toda a comunidade. Quando alguém da comunidade mente para outro membro da mesma, será punido com o desprezo e desvalorização, que é bastante vergonhoso para toda essa família.

Em Portugal fala-se muito em Patriarcas, mas a verdade é que em Portugal não temos Patriarcas, temos homens de razões. Um Patriarca é um chefe de um clã, bairro ou família duma comunidade.

Os homens de razões são juízes de boa fé, que tentam mediar para que ambas as partes fiquem bem.

Normalmente quando o problema é grave chamamos mais do que um homem de razão e provenientes de vários distritos do país.

Quando o problema é dentro da mesma família, tenta-se resolver com a própria família, neste caso a mediação é feita pelo pai, tios ou irmãos mais velhos.

Na minha família, por exemplo, chegaram a vir de Espanha, já que parte da minha família são espanhóis.

A maior parte das pessoas de hoje recorrem aos Pastores Evangélicos por serem homens considerados de boa fé.

Certamente todos nós conhecemos um pouco dos elementos marcantes da cultura cigana tais como o casamento, o namoro, entre outros, sendo que todas aquelas pequenas desavenças normais dentro de cada família ou relação, são ocultas, não sendo expostas fora do seio familiar.

Por exemplo, quando há uma zanga entre famílias diferentes, todos os elementos das duas famílias ficam sem se falar, ou seja, ficam «contrários» e dividem territórios para evitar problemas, neste caso cada um ficará na sua terra natal. Se os dois membros pela mesma terra, sai o que foi considerado que agiu incorretamente e fica o que ficou prejudicado.

 

“Joaquim Rosendo, Mediador Municipal e Intercultural”

 

Crónica do projeto InterCOOLturas - Mediadores Municipais e Interculturais (POISE-03-4233-FSE-000036) promovido pela Câmara Municipal de Castelo Branco em parceria com a Amato Lusitano - Associação de Desenvolvimento com o objetivo de apresentar uma forma simplista como diferentes áreas que compõem o quotidiano do povo cigano e também algumas curiosidades.

 

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